Texto de Leopoldo Bibiano Xavier
D. Pedro II sempre fez questão de que a Imprensa fosse livre. Ela devia ser combatida por meio da própria Imprensa, e não fazendo-a calar:
— Os seus abusos, puna-os a lei, a qual não convém que continue ineficaz, como até agora.
Em 1871, antes de viajar para a Europa, D. Pedro II escreveu algumas instruções para sua filha, a Princesa Isabel, que assumiria a Regência durante a sua ausência. Aí se encontram observações sobre a Liberdade de Imprensa, com o seguinte teor: “Entendo que se deve permitir toda a liberdade nestas manifestações da imprensa e de qualquer outro meio de exprimir opiniões, quando não se dêem perturbações da tranqüilidade pública, pois as doutrinas expendidas nessas manifestações pacíficas, ou se combatem por seu excesso ou por meios semelhantes, menos no excesso. Os ataques ao Imperador, quando ele tem consciência de haver procurado proceder bem, não devem ser considerados pessoais, mas apenas manejo ou desabafo partidário”.
O desvelo do Imperador pela integral observância da Liberdade de Imprensa, como de algumas outras liberdades que ele desejava assegurar com a mais escrupulosa meticulosidade, valeram-lhe naturalmente aplausos calorosos de personalidades públicas e privadas afeitas aos princípios do liberalismo. Mas causaram também desacordo e até estranheza da parte de outras personalidades, que argumentavam, com base em numerosos exemplos históricos, em favor de uma aplicação comedida dos princípios constitucionais de inspiração liberal.
Curioso é notar que a radicalidade do procedimento liberal de D. Pedro lhe valeu até apodos de baixo nível, partidos dos próprios arraiais do liberalismo, como a alcunha soez de “Pedro Banana”.
Foi o Segundo Reinado, da Maioridade à República, o único período da história pátria em que a Imprensa exerceu a sua missão sem entraves preparados para lhe cercear ou suprimir legalmente a liberdade. Quem ler as coleções de jornais antigos da Biblioteca Nacional chegará, inevitavelmente, à conclusão de que nunca a Imprensa gozou de tanta liberdade como durante o longo reinado de D. Pedro II.
Veio a República, e encerrou-se um período único na história da Imprensa brasileira. Foram 49 anos de reinado, em que não houve estado de sítio nem se votou qualquer lei especial contra a liberdade de imprensa. Isso porque Pedro II não o permitiu. Caberia à República o triste fadário de criar peias às liberdades que a Monarquia amparou, protegeu e preservou, dando prova de que isso é possível, e de que, mesmo com a aparência de um erro, pode uma sociedade organizar-se, viver e engrandecer-se sem o recurso à violência, à tirania ou à ilegalidade.
O jornalista republicano José Veríssimo escreveu no “Jornal do Brasil”, em 8 de dezembro de 1891: “Neste País, todos os que têm a honra de empunhar uma pena convencida e honesta, por modesta que seja, reconhecerão que jamais, durante o longo reinado, tiveram que deixá-la cair por falta de liberdade, ou sequer de iludir ou velar o seu pensamento. Todos pensávamos como queríamos, e dizíamos o que pensávamos”.
Ferreira de Araújo, redator-chefe da “Gazeta de Notícias”, afirmou: “Em nenhum país se poderia achar mais liberdades do que as existentes de fato no Brasil. Tudo é lícito dizer na Imprensa, na tribuna, contra a política, contra a Magistratura, contra o Governo, contra o Imperador. Há leis contra o abuso destas liberdades, mas essas leis nunca regularmente se aplicam, e para muitos casos não há leis especiais”.
Souza Ferreira, redator-chefe do “Jornal do Comércio”, propôs: “Aqueles que nos últimos quarenta anos têm vivido na Imprensa, não deixarão de pedir que se lhes reserve espaço na lápide comemorativa para que possam gravar esta verdade: Nunca a livre expansão do pensamento, a Liberdade da Imprensa, teve mais convencido, mais enérgico, mais constante defensor do que o Imperador do Brasil, D. Pedro II”.
O dia 2 de dezembro, aniversário de D. Pedro II, era comemorado em todo o Brasil com solenidade e entusiasmo. Os jornais dedicavam-lhe amplo espaço, inclusive os pasquins da oposição, que se aproveitavam também dessa ocasião para tentar colocar em ridículo o Monarca. Não era desses o “Jornal do Comércio”, que procurava manter-se em alto nível. Em 1868, recebeu este jornal, para publicação naquela data, versos aparentemente inofensivos, enaltecendo o Imperador. E os publicou:
“Oh! excelso Monarca, eu vos saúdo,
Bem como vos saúda o mundo inteiro,
O mundo que conhece as vossas glórias.
Brasileiros, erguei-vos, e de um brado
O Monarca saudai, saudai com hinos,
Do dia de dezembro o dois faustoso,
O dia que nos trouxe mil venturas.
Ribomba ao nascer d’alva a artilharia,
E parece dizer, em som festivo:
Império do Brasil, cantai, cantai!
Festival harmonia reine em todos;
As glórias do Monarca, as sãs virtudes
Zelemos, decantando-as sem cessar.
A excelsa Imperatriz, a mãe dos pobres,
Não olvidemos também de festejar
Neste dia imortal que é para ela
O dia venturoso em que nascera
Sempre grande e imortal Pedro II”.
Nada de especial teriam os versos, se as primeiras letras de cada verso, colocadas em ordem, não formassem uma mensagem insultante: O bobo do rei faz annos. Esse acróstico, cuja autoria não se conhece com certeza, mas é atribuída ao republicano Salvador de Mendonça, provocou protestos e discussões acaloradas, tanto nas ruas quanto através da própria Imprensa. O “Diário do Rio de Janeiro”, por exemplo, escreveu: “Agora mesmo tem o autor dessa poesia degenerada ocasião de comprovar a extensão do amor e da simpatia que o povo brasileiro vota à Família Imperial. Ele não ousou nem ousará jamais declarar-se. E coitado dele se o fizesse!”
Fonte: Instituto Brasileiro de Estudos Monárquicos – IBEM Nacional